Pesquisar neste blog

Comunicado

Comunico a todos que tiverem interesse de compartilhar meus artigos, textos, ensaios, monografias, etc., por favor, coloquem as devidas referências e a fonte de origem do material usado. Caso contrário, você estará cometendo plágio ou uso não autorizado de produção científica, o que consiste em crime de acordo com a Lei 9.610/98.

Desde já deixo esse alerta, pois embora o meu blog seja de acesso livre e gratuito, o material aqui postado pode ser compartilhado, copiado, impresso, etc., mas desde que seja devidamente dentro da lei.

Atenciosamente
Leandro Vilar

segunda-feira, 21 de março de 2011

O Buda


Neste texto procurei falar um pouco da vida deste místico e emblemático homem, e de sua filosofia de moral, de vida e fé. Buda (Buddha em sânscrito) não é um nome próprio, mas sim uma designação que significa "Desperto", "Iluminado", "Esclarecido", assim como a palavra Cristo, significa "Messias" em grego, logo, Jesus Cristo seria "Jesus, o Messias".

Para nós do Ocidente, Jesus Cristo é a figura religiosa mais conhecida e fonte de muitos debates acerca de sua vida e feitos, no caso do Oriente, Buda assume essa posição, e quanto a Maomé, este fica mais relegado ao mundo islâmico. Todavia, tanto Jesus como Buda foram homens de preceitos divinos e que tiveram suas vidas marcadas pela fé e pelo misticismo, enquanto Jesus nasceu de uma virgem, no caso Maria, após Deus determinar que ela seria mãe de seu filho, aviso dado pelo anjo Gabriel, o nascimento do futuro Buda também segue preceitos semelhantes. 

Não se sabe ao certo a época em que Buda viveu, mas sabe-se que ele viveu 80 anos, e costuma-se dizer que ele tenha vivido entre os séculos VI e V a.C. Esse problema de definição cronológica não é único de Buda, pois o próprio Jesus também compartilha essa condição, já que os historiadores ainda hoje questionam a data de seu nascimento, apontando que ele tenha vivido seus 33 anos entre o período de 8 a.C a 34 d.C. Todavia, partamos para conhecer um pouco da vida de Sidharta Gautama o futuro Buda. 

Nascimento e destino:  

Antes de nascer diz a tradição budista que o Bodhisatva (título dado para aquele que viria a ser o Buda), determinou sua próxima reencarnação. Do céu em reunião com os deuses, o espírito que viria a ser Buda, determinou o local, a época e a família onde iria nascer, então ele decidiu encarnar como o filho do rei Sudohodana e da rainha Maya. Sudohodana pertencia a Dinastia dos Shakya, e era rei de Kapilavastu, cidade localizada hoje no sul do Nepal, mas na época pertencia a Índia, logo em termos de nacionalidade, Sidharta era indiano.  

A rainha Maya numa noite teve um estranho sonho: ela sonhou com um elefante branco com seis presas e a cabeça da cor de rubi, que entrou em seu flanco direito. Ao despertar do sonho, a rainha sentiu um bem-estar e muita felicidade. Posteriormente, ela descobriu que estava grávida e meses depois, enquanto caminhava pelo Jardim de Lumbini (hoje no atual Nepal), lá a rainha deu a luz a criança a qual mesmo recém-nascida já sabia andar e falar, então de acordo com algumas tradições a pequena criança teria dito que: 



Vista do templo Maya Devi, Lumbini, Nepal. Local onde a rainha Maya teria dado à luz a Sidharta Gautama. O local é considerado patrimônio mundial da humanidade pela UNESCO.
"Sou o primeiro e o melhor, este é o meu último nascimento e venho dar fim à dor, à doença e à morte. Duas nuvens vertem água fria e quente para banhar a mãe e filho; os cegos enxergam, os surdos ouvem, os aleijados caminham, os instrumentos musicais tocam sozinhos; os deuses do quarto céu se regoziam, cantam e dançam; os condenados do inferno esquecem de sua dor". (BORGES, 1977, p. 10).
Pintura retratando uma das versões do nascimento de Gautama.
No mesmo dia nasceu a futura esposa de Sidharta, Yasodhara, o seu cocheiro Chana, seu cavalo, seu elefante e a árvore na qual ele viria a se tornar o Buda, após meditar sob esta. Enquanto isso, um vidente chamado Asita, desceu de seu reduto nas montanhas e foi ver o filho do rei, Asita havia previsto o nascimento do Bodhisatva, então ele veio examinar o jovem príncipe, procurando pelos sinais que lhe indicariam que aquela criança era a predestinada a se tornar o Buda. No budismo se diz que houveram vários budas, mas Gautama foi mais proeminente e sábio de todos eles. 

Pedra que marca o local do nascimento de Sidharta Gautama, o Buda. O local fica dentro do Templo Maya Devi. 
"Um vidente, Asita [...]. Comprova nele as marcas do eleito: uma espécie de alta coroa orgânica na metade do crânio, pestanas de boi, quarenta dentes muito unidos e brancos, queixada de leão, altura igual à extensão dos braços abertos, cor dourada, membranas interdigitais e centenas de formas desenhadas nas plantas dos pés, entre as quais figuram o tigre, o elefante, a flor de lótus, a montanha piramidal Meru, a roda e a suástica". (BORGES, 1977, 10-11).


Asita fica ao mesmo tempo maravilhado e triste por aquela descoberta, pelo fato de ele ser velho, logo morreria, e não poderia viver para aprender os ensinamentos de Buda. De qualquer forma, Asita e outros sacerdotes disseram para o rei que o sei filho seria um grande rei ou o redentor do mundo, Sudohodana ficou maravilhado com tais notícias, contudo ele preferiu que o filho viesse a se tornar um grande rei, assim ele ordenou que três grandes palácios fossem construídos para o filho. A rainha Maya também soube da notícia, mas faleceu pouco tempo depois.


Sidharta cresceu com as mordomias e o luxo da vida de um príncipe. Ele também foi educado por vários mestres, nas artes, na luta, na filosofia, história e outros conhecimentos; ao completar dezenove anos ele se casou com  sua prima Yasodhara; de acordo com a tradição da época, era comum haver desafios pela mão de uma noiva, assim o pai de Yasodhara testou o futuro genro. Conta-se que no desafio de arco e flecha, Sidharta atirou mais longe que todos os outros pretendentes, e no local que sua flecha caiu, brotou uma fonte. 


Pintura indiana representando o casamento de Sidharta Gautama e Yasodhara.
Contudo não se sabe ao certo quando eles se casaram. Alguns relatos apontam que Sidharta teria se casado aos 16 anos, outros apontam aos 20 anos, e talvez até mesmo depois disso. 

As quatro revelações: 

Sidharta ainda continuou a viver sua vida farta, cheia de regalias, e dos prazeres mundanos por mais dez anos, mas quando este completou 29 anos, num dia, cansado de ficar preso no palácio, decidiu chamar Chana, seu servo de confiança, e visitar a cidade, ele queria ver a vida lá fora. Então ele acabou se chocando com a realidade nua e crua da vida. 

Ao chegar na cidade ele viu um homem moribundo, de cabelos brancos, raquítico e que se apoiava num bastão, o príncipe perguntou para o seu servo quem era aquele homem, e este lhe respondeu dizendo que aquele era um velho, que todos os homens e mulheres ficariam velhos um dia. Em outra rua ele se deparou com um leproso, e Chana lhe disse que nenhum homem estava livre de adoecer. Em outra rua o príncipe se deparou com um morto sendo carregado por outros, e o cocheiro disse que tudo que nasce, morrerá um dia. Prestes a deixar a cidade, já alarmado com o que viu, Sidharta avistou um monge que pedia esmolas, então decidiu voltar para o palácio. Naquela noite ao retornar para o palácio, Sidharta se sentiu mal ao ver que tantas pessoas passavam por necessidades, enquanto ele desfrutava das riquezas em seu "palácio de ilusões". 


Pintura indiana retratando a visita de Gautama e Chana a cidade. Onde o príncipe testemunhou um velho moribundo, um leproso, um morto e um monge. 
Ao retornar ele foi avisado que sua esposa deu luz ao seu filho, chamado Rahula. Sidharta seguiu para vê-los, ao chegar no quarto, ele viu os dois dormindo, a mãe tinha a mão sobre a cabeça do filho o qual dormia tranquilamente, Sidharta queria tocar o filho, mas se sentiu incapaz de acordar tamanha beleza, paz e amor que testemunhava, então ele decidiu partir, e retornar quando já fosse Buda. 


Gautama avista sua esposa Yasodhara e seu pequeno filho, Rahula. 
Com a ajuda de seu fiel cocheiro Chana, ambos deixaram o palácio e partiram para o Oriente, ao se distanciar na floresta, Sidharta entregou seus pertences, o cavalo e suas vestes para o servo, ele também cortou os cabelos, então mandou o servo ir embora. Nessa hora apareceu um asceta o qual segundo algumas versões, foi enviado pelos deuses para auxiliar o príncipe naquele momento. O asceta lhe entregou as três peças do traje amarelo (o traje de um monge): o cinto, a navalha, a tigela para esmolas, a agulha e a peneira para filtrar a água. O monge lhe dissera que Sidharta deveria pedir esmola para sobreviver, nunca ofender aqueles que recusassem em ajudá-lo, pedir apenas o suficiente para se sustentar, e nem enganar os outros, se valendo de quem fosse generoso. A navalha lhe serviria para raspar a cabeça e a barba, a agulha para remendar suas vestes.



Gautama vestido com traje de monges, prepara-se para cortar seus cabelos. Chana carrega nos braços as vestes reais e joias do príncipe. 
Assim, o príncipe passou inicialmente sete dias em profunda solidão, vagando pela floresta, até que decidiu procurar os ascetas que viviam na floresta, lá ele conheceu a rotina de orações, jejuns e abstinências feitas pelos monges, contudo estes lhe disseram que os sábios mestres viviam nas montanhas, e que eles poderiam ajudar Sidharta a encontrar as respostas para suas perguntas.

Em busca da Verdade: 

Ele passou os seis anos seguintes, treinando e aprendendo com os mestres, praticando orações, jejuns e a mortificação e outras atividades próprias dos monges. Contudo após estes seis anos, o monge concluiu que ainda não havia aprendido o que deveria aprender para se tornar o Buda. Para que isso vinhe-se acontecer ele teria que alcançar o Bodhi ("a Verdade"). Então ele deixou as montanhas e seguiu viagem novamente. Num dia, Gautama avistou uma árvore e decidiu que seria naquele local que meditaria até alcançar o bodhi, ele só sairia dali quando se tornasse Buda. Contudo o monge teria um último grande desafio a enfrentar, o demônio Mara, o qual estava associado ao pecado e a morte. O qual queria impedir que Sidharta se torna-se o Buda.



Pintura retratando Gautama meditando para alcançar o Bodhi, enquanto o demônio Mara liderava seu exército para atacá-lo. 
Mara num dia anterior sonhou que seria derrotado pelo monge, que nem mesmo o seu grandioso exército com milhares de feras, gigantes e demônios seriam capazes de derrotar um simples homem, contudo ele não desistiu mesmo assim, e na noite seguinte atacou o monge. Ele levou consigo, seu exército de temíveis guerreiros, feras, gigantes e demônios; flechas flamejantes foram atiradas contra o monge que meditava sob a árvore, porém ao chegarem próximo a ele, as flechas se transformavam em flores; o deus tentou que o medo fizesse Sidharta desistir de sua busca, então enviou suas temíveis criaturas para tentar espantá-lo, mas o monge não se retirou; depois o deus conjurou uma enorme mesa, farta em comida, tentando a rendição ao quebrar o jejum de Sidharta, mas isso também não adiantou.


Sidharta sendo ameaçado pelos demônios de Mara, e tentando pelas mulheres. 
Por fim, Mara enviou suas filhas que tentam seduzir o monge, com música, cantoria e danças, porém Sidharta olha para elas e lhe aponta o dedo, dizendo que não passavam de ilusões, então as belas mulheres se revelam como velhas decrépitas. O exército de Mara entra em confusão e foge, o próprio demônio acaba desistindo.

O Iluminado: 

"Só e imóvel sob a árvore, Sidharta vê suas infinitas encarnações anteriores e as de todas as criaturas; abarca com um golpe de vista os inumeráveis mundos do universo, depois, a concatenação de todas as causas e efeitos. Intui ao amanhecer as quatro verdades sagradas. Já não é o príncipe Sidharta, é o Buda". (BORGES, 1977, p. 14).

Aos 36 anos Gautama alcançou a iluminação, tornando-se o Buda.
"Sete dias mais permaneceu Buda sob a árvore sagrada. Os deuses o alimentam, o vestem, queimam incenso, cobrem-no de flores e o adoram. Chove, e um rei das serpentes, um naga, se enrosca sete vezes em torno do corpo do Buda e forma um teto com suas sete cabeças". (BORGES, 1977, p. 15).  
Um naga protege Buda da chuva. 
Os nagas eram serpentes mitológicas que viviam sob a terra, porém nem todos era maus. No oitavo dia, o naga se transformou num brâmane (casta dos sacerdotes) e disse que protegeu Buda do frio e da chuva, Buda agradeceu ao brâmane e depois este se converteu ao Budismo. Depois do sacerdote, um deus e outras divindades também se converteram ao budismo, então o próprio Criador do Universo, Brahma desceu dos céus com seu cortejo e dissera para Buda que era chegada a hora de iniciar sua pregação para salvar os homens. 


Templo Mahabodhi, Bodhgaya na Índia. Local segundo a a tradição budista fica a árvore no qual Gautama alcançou o nirvana e o bodhi, tornando-se Buda. 
Buda passaria os próximos 44 anos viajando pela Índia em pregação. Sobre isso não relatarei devido a extensão dos fatos que envolvem seus vários anos de pregação, contudo citarei mais três fato importantes. Primeiro, ao retornar para Kapilavastu, Buda reencontrou o seu pai, sua esposa e seu filho Rahula. Sua família e a Corte se tornaram seus discípulos, mas foi neste momento que Buda encontraria um traidor. 


Buda reencontra seu filho e familiares. 
O traidor: 

Como na história de Jesus Cristo, onde Judas Iscariote traiu Jesus e os apóstolos, Buda também foi traído. O seu primo e discípulo Devadata, cobiçava o posto do Buda, este possuía muita inveja do primo, então pactuou com o príncipe Magadha para assassinar o Buda. 


Devadata planeja com Magadha, matar o Buda. 
O príncipe enviou 16 arqueiros para matá-lo, mas quando estes se deparam com ele, sua virtude, sua paz, sua alegria e seu amor, fizeram os homens desistirem de matá-lo. Diz-se que os arqueiros largaram as armas e saíram correndo, de tamanha vergonha. Devadata não desistiu, então enviou um elefante ou vários elefantes furiosos para atacá-lo, porém os animais acabaram se ajoelhando diante de Buda. O mesmo tentou outras vezes matar o Iluminado, mas como todas falharam, Devadata acabou sendo tragado por uma fenda e caiu no Inferno onde foi punido por seus pecados. Buda dissera que a inimizade de Devadata advêm de vidas passadas, quando Buda o ajudou, porém ele foi ingrato com esta ajuda, e nunca o perdoou.


O fim da vida: 

Com seus oitenta anos, o deus Mara retornou para persuadir mais uma vez o Buda de desistir de sua pregação, ele diz que o Buda já conseguira muitos discípulos, e conseguiu transmitir seus ensinamentos. Buda em sua gentileza e tranquilidade, disse para que Mara não se preocupa-se, em três meses ele morreria. Mara e outras divindades ficaram alarmados com o que ouviram, já que de acordo com algumas lendas, Buda poderia viver milhares de anos, na verdade ele seria quase imortal. 

Porém Buda, decidiu antecipar sua morte, concebendo o fato de que estava na hora de ele partir, afinal, como o seu cocheiro havia lhe dito há vários anos: "tudo que nasce, morrerá um dia". Então ele decidiu que sua missão estava completa, ele ensinou o que tinha que ensinar, e era hora de partir, para se libertar da samsara (o ciclo das reencarnações). Quando se alcança-se tal estado, passaria-se a viver nos céus, sem a necessidade de reencarnar na Terra novamente por obrigação. Embora que Buda poderia escolher por sua vontade reencarnar. 

Três meses se passaram, Buda, deixara que o peso da velhice lhe acomete-se, então quando estava em visita a cidade de Kusinara, dizem as versões antigas, que o filho de um ferreiro lhe ofereceu um pedaço de porco salgado ou uma trufa, Buda comeu, e começou a se sentir mal, ele já sabia que isso ocorreria, então ele reuniu seu discípulos que estavam por ali, e disse-lhes que logo morreria, todos ficaram alarmados, contudo Buda explicou seus motivos, e depois deixou suas últimas mensagens e ensinamentos. Ele se encontrava sentado debaixo de duas árvores, ao entardecer. Antes de morrer, Buda disse raque futuras discórdias surgiriam, e os homens deveriam enfrentá-las através da fé. Então ele se deitou sobre o lado direito do corpo, enquanto sua cabeça ficava voltada para o Norte, enquanto contemplava o poente. No cair da noite, Buda já estava morto, as árvores floresceram naquele momento, o espírito iluminado havia deixado este corpo e este mundo.



A desencarnação de Buda. 
"O cadáver é queimado nas portas da cidade, enquanto se celebram ritos solenes dignos de um grande rei, rei que Sidharta não quis ser. [...]. Os restos são divididos em três partes: uma para os deuses, que a guardam em túmulos celestiais; outra para os nagas, que a guardam em túmulos subterrâneos; outras para oito reis, que edificam na terra oito monumentos, aos quais acorrerão gerações de peregrinos". (BORGES, 1977, p. 30). 

Contexto histórico

Não existe um consenso sobre a data de nascimento e falecimento de Buda, costuma-se dizer que ele nasceu em 563 a.C e morreu em 483 a.C, contudo alguns historiadores apontam essa data para mais, recuando até o século VII a.C, onde ele teria nascido em 623 a.C e falecido em 543 a.C. Contudo, o período em que Buda viveu foi um período marcado por grandes acontecimentos e por filósofos. Nessa época, viveram na China o famoso filósofo Confúcio (551-479 a.C) e possivelmente o lendário filósofo Lao Tsé (ainda há divergências sobre a veracidade da existência deste homem); na Grécia Antiga, destacam-se alguns filósofos como PitágorasHeráclito, Pârmenides, Tales de Mileto, etc, filósofos pré-socráticos.

Na época que Buda morreu, Roma já era uma República, o Egito era governado pela XXVII Dinastia, após ser conquistado pelos persas; Dario, o Grande governava o vasto Império Persa; O Império Japonês, havia sido criado há poucas décadas, enfim, muitos outros fatos históricos marcam o período que Buda nasceu e viveu, todavia para vocês que acabaram de ler a respeito da origem e da vida deste homem, devem estar pensando que isso não passa de uma mentira, pura fantasia, mas o fato é que devemos antes de julgar, conhecer o acusado.


Na época antiga, a história e o mito não estavam tão separados assim, como nos dias de hoje. Na verdade tal questão perdurou além da Idade Antiga, outro fato, é que era comum enaltecer a realidade, algo que até hoje costuma-se fazer com determinados ídolos. Sendo assim, glorificar ainda mais os feitos e a vida de um homem era algo comum, lembre-se que muitos reis e políticos antigos fizeram isso, Carlos Magno (747-814), fundador do Sacro Império Romano-Germânico, foi homenageado com lendas sobre seus feitos; o imperador Frederico Barbarossa (1122-1190), recontou a sua origem com uma história bem semelhante a de Móises. Alexandre, o Grande, dizia ser filho de Zeus; Júlio César, dizia que era descendente do herói troiano Eneias.


"A verdade, por escandalosa que seja, é que os hindus importam mais as idéias do que as datas e os nomes próprios". (BORGES, 1977, p. 25).


Não obstante, deve ficar claro ao leitor que muitas das lendas e histórias sobre a vida de Buda e seus ensinamentos foram ganhando distintas versões ao longo dos séculos e pelos locais que passava, o budismo começou a crescer e se espalhar de fato, já no primeiro século da era cristã, cerca de quinhentos anos após a morte de Buda, assim houve muita distorção da história dele, algo comum com outras personagens históricas mais antigas. Não é fácil separar história de lenda, sobre os relatos da vida de Buda. 

O Budismo

Irei falar aqui um pouco da filosofia budista, focando alguns dos seus preceitos principais, e depois falarei um pouco de algumas de suas várias vertentes. O budismo nasceu em uma região já profundamente influenciada pelo Hinduísmo, religião ainda hoje predominante na Índia, além de uma gama de sincretismos e credos menores que se espalhavam pelas distintas regiões indianas da época, sendo assim, alguns dos ensinamentos e preceitos pregados por Buda, foram extraídos destas crenças e moldados por ele, alguns destes princípios são a transmigração, a reencarnação, karma, nirvana, samsara, Inferno, Céu, etc. Pelo fato de cada um desses preceitos terem fatos incomuns, preferi relatá-los em apenas um texto.

A transmigração diz respeito a condição da alma reencarnar em um corpo distinto, algo que não apenas o budistas, hinduístas compartilham, mas também os jainistas, além de outras religiões e filosofias, já que alguns filósofos gregos como Platão, Epicuro, Hermotino e Empêdocles falaram acerca desta condição. A transmigração está diretamente ligada ao karma e logo a reencarnação. A palavra karma significa "ato" ou "ação", ele representa a condição que carregamos de nossas vidas passadas, cada crime que cometemos, gera um karma, que se não for corrigido ou pagado, lhe causará problemas na vida seguinte, e assim sucessivamente enquanto o espírito estiver preso na samsara (Roda da Lei). A reencarnação é um meio no qual procura-se expiar os karmas de vidas passadas, a fim de se livrar da samsara, a qual é o ciclo de reencarnações. Quando um espírito consegue expiar todos os seus karmas, ele esta apto a alcançar o nirvana, logo estará livre da samsara e da necessidade de reencarnar para poder realizar sua expiação.

"Para o budista, os conceitos de transmigração e de karma são inseparáveis e há quem os considere como as duas faces de uma mesma moeda". (BORGES, 1977, p. 50.


Necessariamente o karma não é sempre ruim, existe o chamado "karma bom", o qual lhe segue nas vidas seguintes, isso se mostra em pessoas que se revelam pacíficas, benevolentes, bondosas, que possuem algum talento para as artes, para o conhecimento, virtudes, etc. Mas enquanto o karma ruim permanecer, o espírito será obrigado a expiar o peso de sua culpa através de boa ações ou de sofrimentos, neste ponto entra a questão da transmigração. 

Se uma pessoa foi muito má em uma vida, como punição ela pode reencarnar como um animal, como um asura (um tipo de demônio), um preta (espírito enfermo) ou se tornar um ser infernal, onde a alma é banida para os infernos para pagar por seus pecados. Todavia, para o "karma bom" há a possibilidade de transmigra-se para o corpo de um deva, um tipo de divindade menor.

Sobre o karma o historiador austríaco Paul Dessen tivera uma experiência interessante. Em visita a cidade indiana de Jalapur, Dessen realizou suas pesquisas sobre o budismo, quando decidiu interrogar um homem cego que encontrara na rua, ele perguntou para o homem por que ele havia ficado cego, o homem lhe respondeu "Em uma vida passada, cometi algum crime".


Buda dizia que o karma era algo impessoal e único, cada um tem o seu, algo que se assemelha a metáfora da cruz, que carregamos, e que esta cruz não pode ser passada para outro. Assim, tanto os budistas como os hinduístas, afirmam que você pode ajudar o próximo, mas já mais tomar o fardo do outro, é necessário que cada um aprenda por conta própria.


Mas, se até aqui compreendemos que o karma advêm de nossos crimes e pecados, que devemos reencarnar com sequelas ou não a fim de curar nossas almas na próxima vida, qual caminho ou quais caminhos devem ser seguidos? Para isso, Buda criou a Nobre Senda Óctupla, a qual conduz as Quatro Nobres Verdades, se tais verdades forem alcançadas, você alcançará o estado do nirvana, ou estará bem próximo de alcançá-lo, pois Buda dizia que cada um possui uma velocidade de progresso, uns mais rápido e outros mais lento, mas em ambos os casos, devemos todos pregar e realizar boas ações, cooperando para a harmonia, a paz e o amor no mundo.



"Todas as misérias e descontentamentos da vida, ele [Buda] os filia ao egoísmo insaciável. O sofrimento, ensina ele, é devido à ambição do indivíduo, ao tormento do desejo imoderado. Enquanto um homem não vence toda espécie de ambição pessoal, a sua vida é pertubação e o seu fim, tristeza. Há três formas principais que assumem as ambições da vida e todas são más. A primeira é o desejo de satisfazer os sentidos, sensualidade. A segunda é o desejo da imortalidade pessoal. A terceira é o desejo de prosperidade, mundanismo. Tudo isso deve ser vencido - quer dizer, o homem tem de deixar de viver para si mesmo - para que a vida possa ser serena. Mas quando forme, em realidade, vencidos e não mais governarem a vida do homem, quando o pronome da primeira pessoa desparecer dos seus pensamentos íntimos, então, ele atingiu a mais alta sabedoria, o Nirvana, a serenidade da alma. Pois o Nirvana não significava, como muitos pensam erradamente, extinção e aniquilamento, mas a extinção e aniquilamento dos fúteis objetivos pessoais que tornam, inevitavelmente, a vida mesquinha, ou lastimável, ou horrível". (WELLS, 1966, p. 108).

O nirvana é um conceito que possui vários sentidos de compreensão, seja advindos das distintas vertentes do budismo ou de outras filosofias antigas e modernas, mas essencialmente Buda dissera que o nirvana, palavra que pode significar "ser assoprado", "assoprar", "apagar", "ser apagado", é o estado de paz interior, de pureza, de transcendência dos sentidos, das tentações dos sentidos, uma transcendência física, uma separação da existência deste mundo. Quando se olha para o significado deste termo pode parecer algo complicado de se entender, mas Buda dizia que em nós existia uma Sede ou Desejo (algo chamado de Trishna), o qual é representado por uma chama, é esta "chama" que nos impulsiona a procurar nos saciar pelos prazeres dos sentidos, logo, caindo em vícios e pecados, e isso acaba gerando o karma, e todo o ciclo que fora visto anteriormente. 

Então para se libertar do karma e da samsara, deve-se "apagar" esta "chama". Já que toda a felicidade neste mundo é ilusória, e a verdadeira graça esta no céu. Quando Sidharta meditava para alcançar o bodhi, ele alcançou primeiro o nirvana, e com isso ele poderia ter encerrado seu karma na Terra e ido para um dos Céus, mas ele escolheu ficar e ensinar aos outros, tal fato é referido pela expressão "Buda de compaixão".



Buda e alguns discípulos realizando uma prece.
A ideia de compaixão aqui, está relacionada ao amor ao próximo. Buda sabia que possuía um grande dever, e para isso ele decidiu espalhar seus ensinamentos para que as pessoas com estes saberes pudessem se melhorar, e continuar a ensinar e ajudar mais gente. Negar-se a ajudar um irmão ou irmã que esteja com problemas, era está caindo em um dos males que Buda condenava: o egoísmo e o egocentrismo. 

Além disso, o principio de compaixão não pode ser confundido com a ideia de pena, onde julga-se o outro como sendo um "pobre coitado", pelo contrário, você deve ver naquela pessoa, um irmão que necessita de ajuda, seja qual for, e deve ajudá-lo por amor e não por pena ou interesses alheios. 

As Quatro Nobres Verdades: 
  1. O sofrimento: Buda dizia que o sofrimento era algo real e comum. O mundo (Terra) não é o Paraíso. Todos nós estamos sujeitos a alguma forma de sofrimento. 
  2. A origem do sofrimento: O sofrimento pode ser legado do karma, mas também surge da ignorância, da imprudência, da falta de amor das pessoas, do desejo, do pecado, etc.  
  3. A aniquilação do sofrimento: O sofrimento pode ser aniquilado, ele tem um fim, a reencarnação são formas de combater esse ciclo de provações, até que o espírito se aprimore para alcançar o nirvana
  4. O caminho que conduz a aniquilação do sofrimento: Tal caminho era a Senda Óctupla. Buda dizia que deveria-se ter serenidade, coragem e sabedoria para trilhar esse caminho.
Os caminhos da Senda Óctupla: 
  1. Palavra correta
  2. Ação correta 
  3. Meio de vida correto 
  4. Esforço correto 
  5. Plena atenção correta 
  6. Concentração correta 
  7. Correta compreensão 
  8. Correto pensamento 
"Estas normas integram um caminho do meio, equidistante da vida carnal e da vida ascética, dos excessos do rigor e dos excessos da licenciosidade". (BORGES, 1977, p. 56).


Dharmachakra representando o Nobre Caminho Óctuplo.
Se tais preceitos forem seguidos devidamente, o individuo alcançará o nirvana e sua libertação plena. Alcançando-se o nirvana a última etapa é alcançar o bodhi (a verdade) assim, a pessoa se torna um buda. Em algumas vertentes do budismo, as pessoas procuram se tornarem um buda. Contudo, Buda ensinava que não havia essa necessidade de se tornar um buda, bastava alcançar o nirvana, pois essa ânsia em alcançar a iluminação, pode se tornar traiçoeira, levando a elevação do ego. 

Vertentes dos budismo


O budismo ao longo dos séculos tomou vários rumos, que geraram várias seitas e cada uma possuem identidades próprias, contudo estas vertentes estão agrupadas em três grandes eixos, o primeiro diz respeito aos ensinamentos mais antigos, transmitidos pelo próprio Buda, o segundo eixo é chamado de Mahayana e o terceiro, de Vajrayana. Limitarei-me aqui a falar um pouco da Escola Mahayana, da Vajrayna, e a influência do budismo na China, Japão e o Lamaísmo. Lembrando que existem vertentes budistas no Vietnã, Tailândia,  Camboja, Laos, Taiwan, etc.


Mahayana


Segundo algumas histórias, Buda não apenas pregou para os homens e os deuses, mas também para os nagas, demônios e outros seres, e seus ensinamentos foram copilados por alguns monges e sacerdotes (curiosamente, Buda sabia ler e escrever, mas não deixou nada escrito). Então por volta do ano de 150 da era cristã, um monge budista chamado Nagarjuna, diz ter recebido dos nagas, a doutrina pregada pelo Buda a eles, assim surgiu o Mahayana (Grande Veículo). Nesta nova vertente do budismo, passou-se a designar as antigas doutrinas de Hinayana (Pequeno Veículo), Nagarjuna trazia novas propostas e mudanças para os ensinamentos budistas.


"Os dois veículos têm em comum as três características do ser (impermanência ou fugacidade, sofrimento e irrealidade do Eu), as quatro nobres verdades, a transmigração, o carma e o meio-termo. O Mahayana se distingue pelo idealismo absoluto". (BORGES, 1977, p. 67). 

No Mahayana procura-se atenuar as ideias de karma e de "aniquilação" para se alcançar o nirvana, enquanto Buda dizia que cada um deve construir sua própria salvação através dos preceitos da Senda Óctupla, o Mahayna profetiza que a outros meios de se alcançar esta graça, seja através da repetição do nome de Buda, de oferendas, orações, meditação, sacrifícios, etc. Buda não tinha a proposta de criar uma religião, mas mostrar o caminho para a salvação, o mesmo fez Jesus Cristo, sua ideia não era criar uma nova religião, a fé que eles deveriam ter era em Deus. Jesus se mostrava como um caminho para alcançar Deus, algo que é dito na Bíblia.

A Escola Mahayana, procura introduzir para os seus seguidores, meios mais abertos e menos conservadores do que foi proposto pelas escolas antigas, a ponto de chegar a divergências com os velhos preceitos. Para eles, o importante não é alcançar o nirvana em si, mas si o bodhi, as reencarnações seriam um caminho para isso. Até o próprio conceito de nirvana sofre algumas mudanças. 

No Mahayana acredita-se em vários Budas, sendo Siddharta Gautama o maior de todos, contudo profetizou-se que o próximo Buda retornará a este mundo no ano de 4457 da era cristã, com o nome de Maitreya, que significa "o Compromisso", "O Cheio de Amor".


Budismo Tântrico


Quanto a Escola Vajrayna, essa já toma um novo caminho em relação a escola Mahayana e o budismo tradicional. O Vajrayna também pode ser chamado de Budismo Tântrico e por outros nomes, este consiste numa vertente esotérica e mágica. A magia sempre foi algo comum na vida no Oriente, e mais ainda na Índia, desde tempos antigos. Assim, passou-se a mesclar as doutrinas mágicas e místicas aos ensinamentos de Buda. Não se sabe ao certo quando esta vertente surgiu, mas sabe-se que ela se divide em dois grandes eixos, chamados de a Mão Direita, que visa o principio masculino do universo, e a Mão esquerda que visa o principio feminino do universo.


No budismo tântrico, seus discípulos estudam através do canto de hinos, conjuros, tratados e descrições de seres místicos, que personificam as forças mágicas e da natureza.

"O budismo tântrico crê que a iluminação somente pode ser obtida por meio de uma doutrina esotérica que o mestre, o guru, ensina oralmente ao discípulo, o chela, e que não podemos encontrar nas escrituras sagradas. As práticas compreendem três métodos: a repetição de fórmulas, os gestos e as danças rituais e a meditação que nos identifica com determinadas divindades". (BORGES, 1977, p. 88).


Por volta do século X, as distintas escolas do budismo tântrico, chegaram ao ponto de deificar o Buda, passando a ter-lo como um deus, algo que no budismo original não se tinha. Além disso, o Tantra da Mão Direita, segue um caminho mais conservador em relação ao Tantra da Mão Esquerda, a qual viabiliza a importância das divindades femininas na doutrina, e o papel da mulher na religião, contudo, na Mão Esquerda diferente da Mão Direita, que diz para impedirmos de cedermos as tentações, a Mão Esquerda diz que certos "prazeres" podem ser consumados com moderação.


Tanto as escolas Mahayana e Vajrayana como o budismo tradicional se espalharam por outros locais da Ásia, neste caso falarei um pouco da China e Japão, mesmo tendo o budismo se espalhado pelo sudeste asiático e pego regiões hoje que pertencem ao Afeganistão e Paquistão.


Budismo na China


Na China, não se sabe ao certo em que ano o budismo foi introduzido na região, alguns historiadores apontam que o budismo fora introduzido na região por volta do século III a.C, por monges peregrinos, outros apontam que a introdução se deu no século I da era cristão, no governo do imperador Ming-Ti da Dinastia Han, o qual governou de 58 a 78. Segundo a tradição, o imperador já havia ouvido falar sobre o Buda, mas não conhecia sua doutrina, então numa noite ele sonhou com um homem iluminado, e acreditou que fosse o Buda, então pediu que trouxessem monges budistas para pregar no império. As escolas budistas chinesas, em sua grande maioria derivam da Escola Mahayana.


Todavia, quando o budismo independente da época que tenha chegado após o século III a.C, se deparou ao chegar em território chinês já com duas filosofias profundamente enraizadas na cultura chinesa, o Confucionismo e o Taoismo. O confucionismo advêm dos ensinamentos do filósofo Confúcio, já mencionado por mim anteriormente, onde sua filosofia priorizava uma conduta ética, moral, honra, lealdade, altruísmo, sabedoria, etc., contudo o Confucionismo não é uma religião, mas uma orientação de vida. Quanto ao Taoismo esse se apresenta tanto como uma filosofia de vida, como também uma religião baseada nos ensinamentos do Tao "Caminho", difundidos pelo filósofo Lao Tsé. 


Monges durante uma cerimônia em um templo em Hangzhou, China. 
Ambas as filosofias tomavam a vida dos chineses, e demorou que as ideias budistas se espalhassem e ganhassem novos adeptos, principalmente devido a alguns fatos, como a reclusão em uma vida monástica, o afastamento da família, algo que as outras filosofias pregavam o contrário. Sendo assim, de início os ensinamentos budistas ficaram restritos a poucos homens das classes baixas que buscavam ou eram enviados para a conversão nos vários templos que começaram a surgir. Mesmo com este significativo número de templos que surgiam ao longo do império, por muitos anos o budismo ficou renegado, houve épocas que os imperadores proibiram a divulgação de textos budistas ou a leitura destes pelas cidades. 

Bodhidarma
O budismo na China começou a se transformar a partir do século V, nessa época, várias escolas e seitas já haviam se estabelecido no país, e algumas procuraram mesclar ensinamentos do confucionismo e do taoismo, a fim de tornar a doutrina mais acessível aos costumes chineses. Foi também nesse período que um monge indiano chamado Bodhidarma chegou ao sul da China. Bodhidharma de vertente Mahayna trouxe para o país a tradição Ch'an, a qual ficaria conhecida no Japão pelo nome de Zen. Sua doutrina mesclava os preceito do Mahayana com novos ensinamentos, que incluíam posturas meditativas, chamadas no Japão de zazen. Tais posturas são uma característica desta tradição budista, a qual através da meditação procura-se alcançar o bodhi. Além desse fato, credita-se a Bodhidarma o ensinamento das artes marciais aos monges, e algumas lendas dizem que foi ele quem ensinou os primeiros preceitos do Kung Fu ou Wushu, aos monges shaolin, os quais representam a escola budista chinesa mais conhecida no Ocidente.


Não se sabe quanto tempo Bodhidharma viveu e passou viajando pela China, divulgando seus ensinamentos, mas existe uma lenda na qual diz que ele passou nove anos sentado diante de uma parede, meditando todos os dias, algo que passou a ser chamado de "olhar parede", uma prática divulgada em alguns livros budistas chineses. Ainda hoje o propósito desta prática ainda é incerto, mas tudo indica que era uma forma de se "desligar" deste mundo, a fim de se procurar o caminho para o bodhi.


Lamaísmo


O Lamaísmo ou budismo tibetano surgiu na região montanhosa do Tibete, o qual hoje faz parte do território chinês.


"O lamaísmo é uma curiosa extensão teocrática, hierárquica, política, econômica, social e demonológica do Mahayana". (BORGES, 1977, p. 75).


Diferente de outras escolas budistas, o lamaísmo se mostra como uma religião hierarquizada secular e monástica, até então no budismo tradicional, Buda nunca apresentou hierarquias entre seus discípulos, todos eram iguais, e nunca propôs uma secularização do budismo, algo que ocorreu com o Cristianismo, que acabou gerando a Igreja Apostólica Católica, e após seus vários cismas, as vertentes ortodoxas, protestantes e coptas.

O lamaísmo surgiu no século VII ou VIII, com o monge Padmasambhava, chamado também de Guru Rinpoche. O lamaísmo compartilha algumas características da Escola Varyjuna. Para os tibetanos, Guru Rinpoche foi o segundo Buda, o sucessor de Sidharta Gautama, para outros ele foi mais um dos Budas que viveram no mundo. Todavia, ele foi o fundador da mais antiga escola budista tibetana, a Nyngima


Pintura nepalesa retratando Padmasambhava (Guru Rinpoche).
Hoje existem outras escolas, mas me prenderei a falar essencialmente da organização do lamaísmo que tem como principal figura o Dalai Lama (Grande Rei). Os Dalai Lamas são os líderes religiosos da escola Gelug, e desde o século XIV com a aparição do primeiro Dalai Lama, Gedun Truppa (1391-1414) são os principais representantes do budismo tibetano e de sua política, desde o século XVII. 
Gendun Drup, o primeiro Dalai Lama.
O Dalai Lama, divide sua autoridade com o Panthohen Lama (Glorioso Mestre), ambos formam o poder temporal e espiritual do lamaísmo, algo visto nos papas, principalmente no período medieval. A palavra lama significa "mestre", denotando a hierarquização da religião, mesmo essa possuindo uma vertente popular, apenas os mestres recebem o título de lama. O lamaísmo possui uma série de liturgias, que o diferenciam de outras escolas, liturgias essas que pregam a leitura, o canto e a recitação dos textos litúrgicos, os saddahanas, o conhecimento da música, da pintura, da caligrafia, da escultura, o conhecimento dos antigos ritos místicos e mágicos. Existe uma forte presença demonológica nesta cultura, onde procura-se afastar os demônios e os maus espíritos, algo que também é visto em outras religiões e culturas do Oriente e Ocidente. 

Atual Dalai-Lama
Em algumas escolas do lamaísmo, não admiti-se o karma, para eles o que foi feito de bom e mau aqui será julgado no outro mundo, contudo não significa que não haverá mais reencarnações, independente de karma bom ou ruim. Todavia, no lamaísmo existe uma forte preocupação com a jornada que o morto deve fazer até o seu julgamento, algo não visto em outras escolas. Existe um livro chamado Barde-Thödol (Libertação Pelo Ouvido) o qual representa uma espécie de manual fúnebre no qual deve-se realizar todos os procedimentos fúnebres e as orações para guiar a alma até o Senhor da Morte, onde esta será julgada. Os antigos egípcios possuíam algo do tipo, em seu Livro dos Mortos. Atualmente o décimo quarto Dalai Lama, Tenzin Gytaso, se encontra em exílio do Tibete, devido a perseguição comunista sofrida pelos tibetanos nas décadas anteriores. Todavia, ele ainda é o líder espiritual e político do Tibete.


Zen Budismo

O chamado Zen budismo tem sua origem da tradição Ch'an, trazida para China por Bodhidharma, como dito anteriormente. No século VI d.C. esta tradição chegou ao Japão e ganhou o nome de Zen, posteriormente outras escolas budistas também chegaram ao país. O Zen budismo também foi introduzido em Taiwan e na Coreia, além de outros países. Um fato importante de se compreender sobre o Zen, diz respeito a busca do bodhi, chamado nesta tradição de satori.


De acordo com uma história, Bodhidharma foi interrogado pelo seu aluno Shen-Kuan, o qual havia dito para o mestre que não conseguia compreender os seus ensinamentos, que sua mente estava confusa e sem tranquilidade. Bodhidharma quebrou seu silêncio meditativo e lhe disse: "Mostre-me tua mente e te darei a paz", o discípulo respondeu: "Quando busco minha mente, não dou com ela". Bodhidharma sorriu e lhe disse: "Já estás em paz". Se recordarmos do principio do nirvana dito anteriormente, veremos que o monge Shen-Kuan, não estava longe de alcançar o nirvana e o satori.

Para se alcançar o satori é comum no Zen, utilizar-se do kean, o qual seria uma pergunta sem respostas lógicas. Todavia, de acordo com os ensinamentos do Zen, cada pessoa tem seu próprio tempo para alcançar ou não o satori, isso pode levar meses, anos ou décadas, o satori as vezes é representado pela metáfora de um relâmpago, o qual de forma tão sublime e de repente, ele acontece, assim é quando você alcança o satori

Claro que existem, outros meios de se alcançar o satori, como através da meditação, de exercícios físicos e mentais, já que o zen ensina as artes da pintura, poesia, música, caligrafia, da arquitetura, dos jardins, artes marciais, do arco e flecha, e existem histórias de métodos bem mais severos, que danificavam o corpo. Além destas artes e da meditação, o Zen também prega preceitos de etiqueta, cordialidade, respeito, educação, tradição, características vistas nas cerimônias do chá


Foto de um jardim de um templo zen no Japão. Os templos zen são conhecidos por seus belos jardins, os quais personificam a aproximação do ser humano com a natureza. 
"Para o Zen, os atos mais comuns podem ser executados com um sentido religioso e devem enaltecer a nossa vida". (BORGES, 1977, p. 98).

NOTA: Na China, por volta dos século XV e XVI foi escrito o conto A Jornada para o Oeste, no qual narra a viagem de um monge chinês para a Índia, a fim de resgatar pergaminhos budistas. Na jornada o monge teve que enfrentar muitos perigos e inimigos, então ele foi auxiliado por um cavalo, um porco e pelo rei-macaco Sun Wukong. Tais histórias são bem populares no Oriente, e aqui no Ocidente, o que mais se aproxima desta história é a adaptação criada por Akira Toriyama, na série Dragon Ball. Onde Sun Wukong é conhecido pelo nome japonês de Son Goku
NOTA 2: Os templos budistas japoneses são conhecidos pelos seus belos e intrigantes jardins, o mais famoso é o do templo de Ryoan-Ji em Quioto.
NOTA 3: Os mais antigos templos shaolin existem há mais de mil anos. Desde então monges vem sendo treinados.
NOTA 4: O personagem Shaka, Cavaleiro de Ouro de Virgem da série Cavaleiros do Zodíaco (Saint Seiya), segue uma doutrina budista, fato este que ele sempre aparece meditando, e tendo os olhos fechados para este mundo. Além disso, seus poderes fazem referências a conceitos budistas.  
NOTA 5: Quando o Dalai Lama morre, ele reencarna em uma criança, geralmente da classe baixa e camponesa. Então seus seguidores investigam todas as crianças que nasceram naquele momento, para identificar o próximo Dalai Lama.
NOTA 6: Os conceitos de reencarnação e karma também são compartilhados com o Espiritismo e a Teosofia.
NOTA 7: No hinduísmo Sidharta Gautama é considerado como tendo sido um dos avatares do deus Vishnu, sendo o penúltimo avatar do deus, já que os hindus aguardam a vinda do último avatar chamado Kalki.  
NOTA 8: As estátuas do chamado "Buda gordo" na realidade não são representações do Buda, mas são estátuas do deus japonês Hotei, um dos Sete Deuses da Sorte, ligados a prosperidade, a saúde, a felicidade, bom humor, a caridade, generosidade, etc. 
NOTA 9: Buddha (1972-1983) é um importante mangá do famoso Osamu Tezuka, mestre dos mangás. Nessa história ele narra a vida de Siddharta Gautama do nascimento a até sua morte e finalmente iluminação, mas de forma romanceada. 

Referências Bibliográficas:
BORGES, José Luiz. Buda. Tradução de Alicia Jurado, São Paulo, Difel, 1977. Grande Enciclopédia Larousse Cultural, v. 4, São Paulo, Nova Cultural, 1998.

WELLS, H. G. História Universal - volume II. São Paulo, Companhia Editora Nacional, 1966. (Capitulo XXIV, pp. 101-110). 

Um comentário:

Marcelo Jaz disse...

Obrigado por contar esta historia de forma tao graciosa em nossa lingua!